liderança

liderança

notícias

imprensa

- 19/01/21

Dr. Marcelo Cárgano no Jornal do Comércio

O banimento das contas do presidente norte-americano Donald Trump nas redes sociais trouxe debates sobre liberdade de expressão e segurança na internet à tona. A decisão de sites como Twitter, Facebook e Snapchat foi motivada pelos tweets do presidente sobre a invasão do Capitólio, Congresso dos Estados Unidos, no dia 6 de janeiro.

Apesar de Trump ter alegado censura, especialistas explicam que as companhias têm o direito de definir regras e banir os usuários que não as seguem, como foi o caso do presidente, que também divulgou informações falsas sobre uma possível fraude nas eleições.

O jornalista e advogado especialista em Proteção de Dados Pessoais e Privacidade Marcelo Cárgano explica que o bloqueio de Trump destas redes sociais não viola a Primeira Emenda à constituição norte-americana, que garante o direito à liberdade de expressão. “Tal garantia impede apenas que o governo imponha restrições à liberdade de expressão e não a empresas privadas. Pelo contrário, essas empresas têm o direito de estabelecer suas próprias políticas sobre comportamentos aceitáveis ou não, e Trump violou diversas vezes essas regras”, complementa.

Na ocasião, Trump postou na sua conta do Twitter, com mais de 88 milhões de seguidores, que a eleição que elegeu Joe Biden presidente não era válida. A empresa, então, proibiu qualquer tipo de interação com o tweet e publicou um aviso sobre a inveracidade da informação.

Para o professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo e diretor do Instituto LGPD, Juliano Maranhão, esses eventos não são incomuns. “O importante é que haja clareza por parte das plataformas quanto aos critérios para que uma postagem ou atividade de conta seja considerada abusiva, bem como ofereça mecanismos para que os indivíduos afetados possam contestar ou discutir a decisão de excluir o conteúdo ou conta.”

Segundo Maranhão, a obrigatoriedade desses mecanismos vem sendo discutida no Projeto de Lei 2.630/20, de iniciativa do Senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE), de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet. “O principal ponto que impulsiona a discussão do PL 2.630/20 e leis específicas em outros países, como na Alemanha, é o fato de que essas plataformas se tornaram a principal infraestrutura de comunicação pública”, acrescenta.

Cárgano ressalta que não é possível negar que parte considerável do debate público ocorre hoje por meio destas plataformas. “Devido ao número de usuários, o alcance global, e o virtual oligopólio representado por estas empresas, ser banido dessas redes sociais significa, em certa medida, ser banido do próprio debate público.”

Mas o especialista também entende que, caso não fosse o presidente dos Estados Unidos, o Twitter teria banido Trump há muito tempo. “A empresa, no entanto, possui uma política sobre o uso da plataforma por líderes mundiais, na qual afirma que sua ideia é tentar permitir que cidadãos possam ouvir diretamente as autoridades eleitas, e baseia-se no princípio de que as pessoas têm o direito de fazer os que estão no poder prestar contas abertamente.”

A advogada especialista em Proteção de Dados, Direito Digital e Propriedade Intelectual Luiza Sato acredita que seja importante fazer esse debate, lembrando que a liberdade de expressão não é um direito absoluto. “A liberdade de expressão possui limites previstos em nossa legislação. Importante assim saber que não é por estar atrás de uma tela de computador que estará livre das leis aplicáveis no mundo.”

A partir disso, ela acredita que possa ser benéfico a elaboração de normas específicas para essas situações. “Uma atuação conjunta entre órgãos públicos e plataformas virtuais poderá evitar abusos e garantir que, tanto a liberdade de expressão como outros direitos fundamentais, sejam devidamente protegidos.”

“Fora das redes sociais, entretanto, deve haver outros procedimentos legais para a atuação das figuras públicas. Como exemplo, autoridades de nossos Poderes Executivo, Judiciário e Legislativo não podem atuar de forma livre e irrestrita”, contrapõe a especialista. Para ela, as condutas de pessoas políticas devem seguir o decoro previsto no ordenamento jurídico.

Maranhão também percebe uma forma mais ampla de proteger as redes sociais de outras situações parecidas. “Na minha opinião, as instituições públicas que entenderem haver risco social ou incompatibilidade de alguns possíveis comportamentos de seus servidores nas redes com o cargo ou função pública exercida, devem buscar regulamentar o tema.”