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- 05/01/21

Abe no CONJUR

Quase no apagar das luzes de 2020, o Direito do Trabalho voltou a ser destaque nas manchetes. O Supremo Tribunal Federal trouxe à pauta o julgamento das ações que pedem a declaração de inconstitucionalidade do contrato de trabalho intermitente, figura regulamentada pela reforma trabalhista de 2017 e uma das principais promessas do governo Temer para a criação de empregos.

O trabalho intermitente é aquele em que a pessoa é contratada formalmente como empregada, por escrito e com a carteira de trabalho assinada, mas não presta serviços de forma contínua, havendo alternância de períodos de prestação de serviços e de inatividade. A prestação dos serviços pode ser determinada em horas, dias ou meses, independentemente da atividade desenvolvida (exceto para os aeronautas) e o empregado, se quiser, pode recusar a convocação para o trabalho, sem que isso seja caracterizado como insubordinação.

Não existe continuidade na prestação de serviços e o empregado recebe, imediatamente ao final de cada período, pelo tempo efetivamente à disposição do empregador, com o acréscimo proporcional das férias, 13º salário, repouso semanal remunerado, FGTS e contribuições previdenciárias. Vale frisar que se o trabalhador tem a certeza de que será chamado em momentos específicos, com habitualidade, o contrato intermitente pode ser descaracterizado e reconhecido o vínculo de emprego comum.

O modelo existe em diversos países do mundo. No Brasil, foi inicialmente idealizado para o segmento de restaurantes e bufês, cuja demanda aumenta durante alguns períodos e diminui em outros. A reforma trabalhista, portanto, formalizou uma prática antiga, mas que não possuía regulamentação legal: a contratação de empregados com jornada móvel ou períodos de entressafra (com o pagamento das horas efetivamente trabalhadas). Essa modalidade, inclusive, foi declarada válida pelo Tribunal Superior do Trabalho em 2015, tendo em vista a garantia de pagamento do salário mínimo proporcional à duração do trabalho.

Com base no Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), o Ministério da Economia apontou que foram registradas mais de 155 mil contratações sob essa modalidade em 2019, o que representou 1% de todas os contratos com carteira assinada firmados no país. O número é superior ao dobro do registrado em 2018, quando foram formalizados 71 mil contratos de trabalho intermitente, que representaram 0,5% dos contratos com carteira assinada.

Enquanto o número de contratos intermitentes aumentou em 117,5% na passagem de 2018 para 2019, o número total de carteiras assinadas aumentou em apenas 4,6% no mesmo período, o que dimensiona o avanço da nova modalidade de trabalho.

Agora em discussão no STF, o relator do processo, ministro Edson Fachin, entendeu que essa espécie de contrato é inconstitucional, pois não há garantia de quantidade mínima de trabalho por mês, nem previsibilidade de novas atividades, gerando insegurança econômica ao trabalhador e sua família, ferindo garantias fundamentais como, por exemplo, a dignidade da pessoa humana e a salvaguarda da remuneração não inferior ao salário mínimo nacional.

Por outro lado, a divergência é no sentido que o contrato de trabalho intermitente não representa supressão de direitos trabalhistas, fragilização das relações de emprego, tampouco ofensa ao princípio do retrocesso, sendo constitucional porque assegura ao trabalhador o pagamento do salário proporcional (nunca inferior ao mínimo ou ao salário pago no estabelecimento aos trabalhadores que exerçam a mesma função) e das parcelas previstas na Constituição. Já votaram pela constitucionalidade os ministros Nunes Marques e Alexandre de Morais.

Ponderando os pontos de vista em debate no STF, entendemos que o trabalho intermitente, apesar da parca regulamentação pela reforma trabalhista, é constitucional, pois assegura a formalização do contrato de emprego nas atividades em que de fato há descontinuidade de serviços (o que diretamente beneficia o indivíduo e, indiretamente, toda a sociedade), sendo sempre garantido o pagamento do salário proporcional ao trabalho prestado, em consonância com o texto constitucional.

Por óbvio que o contrato de trabalho tradicional oferece maior segurança, por estabelecer salário e jornada fixos, porém, a nova modalidade oferece proteção social à uma parcela de trabalhadores até então informais, que executam serviços sem nenhum tipo de contrato, regularizando-os ou reinserindo-os no mercado de trabalho com direitos assegurados na Constituição. A rigor, portanto, o contrato intermitente deve ser aplicado apenas em atividades marcadas pela descontinuidade e intensidade variável de serviço (bares, restaures, bufês, diaristas, construção civil etc.).

Muito embora o julgamento tenha sido suspenso pelo pedido de vistas da ministra Rosa Weber, devendo ser retomado apenas após o recesso do Poder Judiciário, ao que tudo indica o STF declarará a constitucionalidade do trabalho intermitente, garantindo a harmonização entre os fundamentos constitucionais do valor social do trabalho e da livre iniciativa.

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